Reunião de 18/5/2015

“Oportunidades e avanços na segurança pública brasileira”

“Houve leniência do Estado [na questão da violência do Rio]. Os políticos, em vez de resolverem isso, homologaram essa desordem, admitindo a ligação clandestina de água e luz elétrica e colocando transporte lá [nos morros]. Tudo isso em nome de uma conta: a do voto”.

Somos um país acometido por violência endêmica. Pelos padrões da Organização das Nações Unidas (ONU), qualquer taxa acima de 10 homicídios a cada 100 mil habitantes é considerada epidemia. De acordo com o Mapa da Violência, o Brasil registra anualmente 21,9 mortes violentas para cada grupo de 100 mil habitantes. Na reunião de 18/5 do Núcleo de Altos Temas do Secovi-SP (NAT), com a presença do secretário de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, esse problema foi o ponto central das discussões, focalizando especialmente os avanços obtidos pela cidade do Rio de Janeiro com a implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

“Além do desconforto na vida diária da população, o medo e a insegurança têm sequelas graves. Geram transtornos emocionais que, muitas vezes somatizados, prejudicam a saúde das pessoas”, disse o presidente do Sindicato, Claudio Bernardes, para quem as consequências disso implicam transtornos que podem impactar na vida familiar e profissional das pessoas, afetando sua produtividade e, por conseguinte, desencadeando efeitos na economia do País. “Isso nos leva a indagar: afinal, qual o custo da insegurança para o Brasil, cujos índices de criminalidade situam-se acima da média mundial, notadamente no que diz respeito a crimes violentos? Essa é uma conta interessante a se fazer, a exemplo de outras tantas, como a que mediu o impacto da falta de saneamento básico no volume de pessoas que adoecem por essa razão, sobrecarregando o já deficitário Sistema Único de Saúde (cada R$ 1 investido em saneamento economiza R$ 4 no campo da saúde)”, completou.

Romeu Chap Chap, coordenador do NAT, destacou o feito de Beltrame à frente da Segurança no Rio de Janeiro, cujo grande desafio centra-se no combate ao império do tráfico estabelecido nos morros da capital fluminense. “O secretário colocou todo o seu talento, sua coragem e boa vontade a serviço da sociedade, procurando criar um cinturão de segurança onde a fragilidade era maior, por meio da criação de Unidades de Polícia Pacificadoras em 40 favelas, próximas de instalações utilizadas na Copa do Mundo”, ressaltou Chap Chap, que aduziu os recentes reveses sofridos pelas UPPs, como conflitos entre traficantes nas favelas do Alemão, da Rocinha, da Mangueira e do Mar. “No Complexo da Maré, 130 mil moradores se acostumaram a dividir espaço com tanques de guerra e homens do Exército. Agora, após mais de seis anos, as Forças Armadas partiram em definitivo de um dos locais considerados estratégicos para distribuição de drogas. A saída dos três mil soldados deixou as gangues à vontade para atuar e guerrear. E mesmo que o efetivo da UPP local seja reforçado e chegue a 1.200 policiais, é óbvio que será insuficiente […] Assim, senhor secretário, não seria natural indagar qual será o futuro das UPPs?”

Negligência histórica – Como capital do Império, a cidade do Rio de Janeiro atraiu um sem-número de imigrantes, crentes de que, ali, poderiam se estabelecer e colher prosperidades. “As pessoas procuraram a cidade em busca do eldorado profissional”, disse Beltrame. Em virtude da topografia característica da cidade – morros margeados por asfalto e a existência da maior floresta urbana do mundo em seu seio –, essas pessoas começaram a se instalar em qualquer lugar. “O Rio de Janeiro não tem periferia. Temos os morros, que foram ocupados precariamente”, frisou o secretário.

A resposta das autoridades a esse cenário não foi dada à altura, na avaliação de Beltrame. “Houve leniência do Estado. Os políticos, em vez de resolverem a questão, homologaram essa desordem, admitindo a ligação clandestina de água e luz elétrica e colocando transporte lá. Tudo em nome de uma conta: a do voto”, destacou, emendando que a sociedade é culpada coletivamente, pois “não é factível alguém morar na Vieira Souto e ver os barracos se instalando no Vidigal.”

Na década de 70, as drogas chegaram à cidade, dando início a três facções criminosas. Os traficantes, para fazer prosperar seus negócios, instalaram-se nos morros, de onde muito dinheiro oriundo do tráfico começou a sair para irrigar os escaninhos do sistema, corrompendo e ganhando o apoio de autoridades que, por força de lei, deveriam tomar por anátema a barbárie que começara a ganhar fôlego. A sequela não poderia ser outra: a Rocinha tornou-se o maior ponto de venda de droga da América do Sul, razão pela qual o território, disputado por gangues rivais, acabou maculado pelo terror e tingido de sangue. “Isso ficou sem ser visto por 30 anos. É imperdoável que as autoridades, os governos e os políticos tenham ignorado tudo isso tanto tempo”, lamentou o secretário.

O caminho para arrefecer o medo dominante não foi fácil. Beltrame contou que, antes dele, o comando da polícia era escolhido pela Assembleia Legislativa. Hoje, essa decisão é de incumbência da secretaria sob sua responsabilidade. Esse passo foi representativo, pois o chefe de polícia não mais era indicado por questões políticas. “Eu não sou político. Todos os meus antecessores viraram políticos. Eu não”.

Há, no entanto, obstáculos que fogem à alçada de sua vontade. “Um incontável número de armas entra ilegalmente no País pelos 16 mil quilômetros de fronteira seca”, ponderou. Fez menção, também, à morosidade imposta pela lei aos processos de licitação. “Levei cinco anos para reequipar as forças militares com fuzis, enquanto os traficantes iam se armando com o que tem de mais avançado. Para comprar colete à prova de balas, algo que salva a vida de policiais, é uma burocracia sem fim. A Lei de Licitação é uma coisa burra, pois parte do pressuposto que todo administrador público é ladrão”, enfatizou, sob aplausos dos presentes. “O Judiciário concedeu ao ‘Fu da Mineira’, traficante condenado a 59 anos de prisão, cinco dias para visitar a família. Vocês acham que ele voltou para cumprir o resto da pena? Claro que não! Depois não venham falar mal da polícia. Nós prendemos; o Judiciário soltou!”

Segundo Beltrame, a maioria das Unidades de Polícia Pacificadora está dando certo. “Desde que cheguei [à secretaria], só falta, agora, prender dois dos traficantes mais procurados”. Desde 2008, houve a redução de 65% no índice de homicídios e de 78% nos autos de resistência. Mais de dois mil policiais foram expulsos da corporação.

Para ele, o passo seguinte é a adequada urbanização das favelas do Rio. “Visitei uma favela aqui em São Paulo e, pelo que vi, as ruas são largas. Nos morros do Rio não é assim. Há casos em que o teto de uma casa emenda com o de outra. Você sobrevoa a região, e não consegue ver o que acontece nos corredores desses lugares. Como vou colocar polícia em um lugar desses?”, contextualizou. “Essa é uma questão em que ninguém quer mexer. Os políticos só batem naquilo que não precisam bater. Mas nisso, não põem a mão.”

Beltrame, que não se mostrou otimista com a segurança pública no Brasil (é preciso investir na educação em período integral, mudar a Constituição e o sistema penitenciário, dentre outros), disse que as UPPs são adequadas para o Rio de Janeiro. Há favelas com apenas duas ruas. No mais, há becos onde passam uma pessoa por vez. “Em São Paulo, que é mais plano, acessibilidade e urbanização são muito mais eficazes. Quanto mais cidadania, menos polícia”, resumiu.

Leandro Vieira
Assessoria de Comunicação/ Secovi-SP

Galeria de Fotos

Fotos: José Carlos Tafner Jorge

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