Reunião de 6/4/2009
“Reforma Tributária”

Em reunião realizada dia 6/4, o Núcleo de Altos Temas (NAT) recebeu o deputado federal Antonio Palocci, que focalizou a sempre esperada reforma tributária.
Conforme o deputado, as condições para que a matéria finalmente avance são bastante promissoras. Para ele, há grandes chances de alterações importantes serem aprovadas ainda este ano. “Se ficar para 2010 será complicado, pois estaremos em período eleitoral”, sentenciou.
Abertura
Romeu Chap Chap, presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP e coordenador do NAT, destacou que a carga tributária atual é duas vezes maior da que ocasionou a Inconfidência Mineira. “Naqueles tempos, os 20% cobrados pela Coroa Portuguesa sobre a produção eram chamados de ‘o quinto dos infernos’. Pois bem. De acordo com o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – IBPT, a atual carga tributária brasileira é de 38%, o que representa praticamente 2/5 (dois quintos) de nossa produção. Resumindo: pagamos hoje Dois Quintos dos Infernos!.”
De acordo com Chap Chap, em meio a tantas tentativas de reforma tributária, às vezes desanimamos. “Mas ao saber que o tema está agora em mãos de um parlamentar do quilate de Antonio Palocci, a coisa muda um pouco de figura, pois ele é um homem de resultados. Digo isso com conhecimento de causa. Afinal, foi na gestão dele, como ministro da Fazenda, que o setor imobiliário renasceu. Foi nosso grande interlocutor. Soube ouvir, acatou sugestões, dinamizou os financiamentos, estimulou o setor, gerou empregos e movimentou positivamente a economia nacional. Tais fatos nos autorizam acreditar que algo de maior e melhor em termos de reforma tributária poderá finalmente acontecer.”
João Crestana, presidente do Secovi-SP, adicionou que as reuniões do NAT se constituem em fórum para discussões de instituições positivas, como propriedade, credibilidade, família, as quais acabam formando uma cultura importante para a Nação. Lembrou que os avanços iniciados por Palocci, no campo habitacional, têm agora continuidade. “Estamos na segunda parte, que é o atendimento às famílias de baixa renda, oferecendo-lhes condições de acesso à habitação popular. Medidas estão sendo adotadas para enfrentar o déficit de oito milhões de moradias, tarefa que exige um movimento de Estado e não de governo.”
No que diz respeito à reforma tributária, Crestana lançou uma questão ao deputado Palocci: “A reforma tributária que teremos vem ao encontro do que a sociedade quer ou será uma reforma mais ligada às necessidades das três esferas de governo? Será que os interesses da sociedade civil estarão refletidos?”
Antonio Palocci – Palestra
A crise mundial
O Brasil pode se tornar uma nação rica após a crise, com estabilidade, aberta ao mundo, sem pobreza, com tecnologia e pujança se enfrentar questões básicas de forma definitiva. Hoje, diante da crise, o País é visto lá fora como melhor que o México ou a Rússia. É sólido, não depende de um único produto, é diversificado no comércio internacional, possui potencial. Conta com dez anos de responsabilidade fiscal e 15 anos de inflação sob controle, bem como melhoria da renda da população, que participa dos ganhos.
Chegou a hora de projetarmos um país de primeiro mundo. A próxima etapa não pode mais ser a estabilidade, mas como promover uma distribuição de renda mais efetiva, o que inclui habitação para todos e outros pontos fundamentais.
Retomada da Construção
Em 2003, após um ano de trabalhos para enfrentar a crise de insolvência gerada pela fuga de capitais, a construção civil caiu 7% e o PIB cresceu apenas 1%. Conversei com o presidente Lula, mostrando a ele que esse setor era motor do crescimento. Lula entendeu e passou a cobrar medidas para destravar o crédito imobiliário, reduzir tributos, etc. Romeu Chap Chap, Décio Tenerello e Antoninho Marmo Trevisan estiveram reunidos conosco, discutindo cada ponto que obstaculizava o financiamento (inclusive de ordem jurídica). A legislação do setor estava errada. Iniciamos um processo que resultou na recuperação da construção civil, a qual será fator de crescimento econômico.
A questão do subprime
Hoje, pós-subprime norte-americano, verificamos que o que deu errado não foi a construção civil. O que deu errado foi contrariar conceitos básicos, como permitir que a hipoteca da família fosse utilizada para outros gastos. Os EUA criaram valor para coisas irreais e aconteceu a quebra. Portanto, a construção civil daquele país voltará a ser instrumento de crescimento, como o foi por décadas.
Um milhão de casas
No Brasil, perdemos tempo em trazer o setor da construção ao patamar de importância que ele tem para a economia. Lula fala um milhão de casas até 2010. Muitos dizem que isso não é possível, mas não me preocupo. O que precisamos é trabalhar num projeto fundamental, rever custos, movimentar as empresas que trabalham com habitação de interesse social, ajudar o governo nos ajustes para que se possa partir para um projeto de cinco, seis ou sete milhões de moradias nos próximos três governos. Precisamos de um salto na construção civil, que já nasce diferente. Na baixa renda, é melhor subsidiar com recursos do Orçamento Geral da União para não criar um passivo futuro, que terminará espelhado em inflação maior ou elevação de tributos. Com o tempo, vamos saber se o tamanho do subsídio é pouco ou muito.
Reforma tributária: há 12 anos em discussão
Há muito tempo que lido com a questão da reforma tributária, que só na Câmara dos Deputados é discutida há 12 anos. Existe uma resistência enorme para se instituir um sistema tributário mais adequado, simples, limpo e eficiente. O Brasil tem o ICMS estadual que representa uma distorção difícil de resolver. É o tributo que mais arrecada no País, com 27 leis, 27 alíquotas, etc. É o pior imposto para ser estadual, pois uma empresa pode operar em dez estados diferentes. É o ‘quinto dos infernos’ a que se referiu Romeu Chap Chap. É por isso que os departamentos tributários de grandes empresas têm 500 funcionários.
Duro de entender
Até hoje não entendi tudo sobre tributação no Brasil. Entender como funcionam as leis em diversos estados e municípios é muito complicado. Os governos estaduais não abrem mão de manter o ICMS e o poder de modificá-lo. Se conseguíssemos unificar a legislação e as alíquotas obteríamos um avanço extraordinário. E os governadores começam a concordar com isso, pois é uma forma de simplificar.
Unificar é preciso
Por que não unir ICMS com IVA federal, como existe na Alemanha? Há um projeto de Francisco Dornelles no Senado que prevê essa possibilidade, mas não acredito que haja condições de se construir um acordo com os governadores. A carga seria menor e o sistema mais simples. Da forma atual, a tendência do fisco é cobrar e apertar cada vez mais os que já pagam. Certa vez, quando ainda estava no Ministério da Fazenda, fui procurado por uma empresa que me fez um apelo: pedir para que a Receita Federal a visitasse menos. Afinal, num período de janeiro a junho, os fiscais foram àquela empresa 180 vezes (praticamente, moravam lá).
Exemplo de São Paulo
Precisamos de sistemas mais simples, como fez o Estado de São Paulo com a nota fiscal eletrônica, modelo que deverá estar implantado em todo o Brasil, no prazo de cinco a seis anos. Um dos grandes problemas da reforma tributária é justamente este: simplificar e unificar o ICMS. PIS, Cofins e outros tributos também.
Distorções
Outro aspecto da reforma tributária diz respeito à resolver questões relativas a coisas que são desoneradas de forma equivocada ou então exageradamente tributadas. Exemplo disso é o investimento bruto, duramente penalizado. Se um cidadão resolve investir R$ 500 milhões ele vai precisar de R$ 150 milhões na mão para pagar impostos. Isso é uma distorção. Imposto deve incidir sobre resultado, sobre lucro, e não impedir que se inicie um processo produtivo. O imposto sobre investimento deve ser eliminado na reforma.
Folha de Pagamento
A reforma também deve contemplar a redução de tributos na folha de pagamentos, hoje superior a 20%. A proposta é tirar 8,5% desse custo, o que é significativo e vai impactar setores que absorvem intensa mão-de-obra, como construção, educação e saúde.
Desoneração
Ainda na linha de promover significativa desoneração, a reforma pretende resolver problemas de crédito sobre bens de uso e consumo. Tributar diretamente a produção gera crédito, mas não gera débito. Ou seja, gera um inferno e uma eterna discussão jurídica sobre o que pode ou não ser tributado. A meta é acabar com essa discussão. Insumo na produção (a energia usada na máquina ou no estacionamento) gera crédito. Nossa legislação tem coisas que só servem para complicar.
Mais desoneração
Outro movimento na linha da desoneração diz respeito à lei de apuração do crédito e da devolução do crédito. Empresas exportadoras brasileiras devem estar com alguns bilhões de reais de acúmulo no ICMS. Se uma empresa do Rio Grande do Sul compra um insumo em São Paulo e Minas, paga ICMS nos dois estados. Isso vai ser resolvido com a transferência do ICMS para o destino e, com a nota fiscal eletrônica, os prazos para devolução de créditos serão acelerados (quatro meses, no máximo).
Fim do inferno
Queremos que o imposto deixe de infernizar a vida das empresas. Há muitos outros detalhes na reforma e temos chance de fazer avanços consistentes.
Reforma para a sociedade
Essa é uma reforma da sociedade e não dos governos, como questionou João Crestana. Até porque se fosse dos governos já estaria realizada. É da sociedade, incluindo mecanismos para evitar aumento de tributos por meio da majoração de alíquotas.
Expectativas
Estudos internacionais revelam que o Brasil gasta 2.600 horas para pagar impostos – a média, no mundo, é de 600 horas. Desonerar e simplificar são aspectos que estão atendidos no atual projeto de reforma tributária. Mas, vale lembrar, construímos esse projeto quando o País crescia. Com a crise, a arrecadação mergulhou e assustou os prefeitos. Mesmo assim, acredito que a reforma tem condições de avançar nesse momento. Deixar para o segundo semestre ou para o próximo ano será complexo. Espero que todos vocês, do NAT, possam também contribuir com sugestões.
DEBATES
Denis Lerrer Rosenfield, professor de Filosofia e articulista – É possível fazer a reforma antes das eleições? Vivemos um cenário político pré-eleitoral precipitado. Este cenário favorece ou prejudica?
Antonio Palocci – Na Câmara, fazemos os debates, escolhemos um dia e votamos. A reforma tributária foi aprovada na Comissão numa madrugada estendida. Aprendemos isso com Ulysses Guimarães. Temos tempo de aprovar no prazo certo, pois existem condições políticas. A única coisa diferente hoje é a inversão da arrecadação, por conta da crise economia. Mas não estamos tirando nem dando dinheiro para os governos. Estamos apenas simplificando. Quem pode ser contra a isso? Acredito que possamos votar ainda nesse semestre e, no próximo, a matéria vai para o Senado, onde a discussão é mais simples. Em 2010 será muito difícil aprovar uma reforma dessa magnitude.
Fábio Barbosa, representante do HSBC – Como vê, em médio prazo, o direcionamento da caderneta de poupança para o crédito habitacional?
Antonio Palocci – O Brasil está conquistando a menor taxa de juros da história. Nosso juro real está em 5,2% e vai cair mais, pois conseguimos fazer com que a crise não gerasse desvalorização cambial. Ideal para o Brasil é não ter vinculação de crédito – isso foi criado porque o crédito para habitação era insuficiente. Se não consertarmos o problema da poupança, o crédito imobiliário será encarecido. A oposição já promete brigar, mas a questão é assegurar o crédito no País, para que seja normal, sem distorções. Acredito que a caderneta de poupança vai ter de sofrer um ajuste e a construção civil será mais atrativa e tomará muitos empréstimos do que os existentes. Lembro que, antes, os bancos não tinham tomador. Isso mudou e tende a mudar com maior celeridade ainda. A normalização da economia e a queda dos juros tornam a aquisição imobiliária interessante para investidores e poupadores.
Cláudio Elias Conz, presidente da Anamaco – São Paulo e Minas Gerais devem entrar na substituição tributária. Teremos 27 diferentes substituições, criando dificuldades, com o ICMS sendo cobrado antes que a mercadoria circule. Isso não prejudica a reforma?
Antonio Palocci – Há dificuldade em se mudar imposto nesse momento de crise. A substituição tributária traz algumas distorções na questão do tempo e do valor. A saída e conversar com os governadores. A reforma muda muito o ICMS, mas antes disso só o diálogo resolve.
Luiz Flávio Borges D’Urso, presidente da OAB-SP – Uma questão que aflige a população é a dos precatórios. Tira dinheiro de circulação e cria desigualdade. A reforma poderia prever uma compensação entre o que o Estado deve para o cidadão e vice-versa? A PEC 2, aprovada no Senado, dilui o crédito que o cidadão tem. Preferimos um sistema de compensação, pois a demora faz com que, no desespero, a pessoa venda seus créditos com deságio de 20%.
Antonio Palocci – O projeto do Senado prevê acelerar o pagamento, mas com deságio. Vejo com bons olhos a compensação; não há motivo para não fazer isso. É um bom tema e talvez nem precise ser incluído na reforma tributária, pois se trata de um procedimento prático. A Receita pode gostar ou não, mas o bom senso tem de prevalecer.
Lúcio Abraão, Trevisan – A questão do ISS cobrado por 5.500 municípios brasileiros não faz parte do contexto da reforma. Como vê a integração dos municípios, num segundo momento, como forma de acabar com a guerra fiscal?
Antonio Palocci – O Senado tem um projeto mais amplo, que inclui o ISS. Acho um modelo mais correto, mas tem a maioria dos prefeitos contra. Creio que fazendo em duas etapas a unificação será melhor para todos. Mas não acredito que seja bom para vocês. A cobrança fica mais uniforme, porém tende a ser maior se o ISS for vinculado ao IVA federal. O Senado quer fazer tudo de uma só vez. Se os governos toparem, a Câmara não vai se opor. Tudo dependerá do andamento político. Há desconfiança de que a União não distribuiria os recursos, como também há a questão do poder de tributar que os estados não querem perder. Poder de tributar é poder de governar, mas isso está criando um inferno para a nação.
Antonio Gil, revista Vida Imobiliária – Quanto à simplificação tributária, questiono sobre o tempo que se leva para abrir uma empresa no Brasil. Em Portugal, isso é feito em uma hora; aqui, consome nove meses. Isso é um entrave ao investimento internacional. No que se refere ao pagamento de taxas, a despesa (de 6%) parece pequena, mas depois se descobre que tudo é pago três vezes. Embora, ainda assim, o valor seja menor que o pago na Europa, o problema é a complexidade, que nos obriga a aconselhar os investidores externos a, como primeira medida no Brasil, contratar o melhor consultor fiscal, pois a confusão é imensa. No projeto da reforma houve a preocupação de acompanhar padrões internacionais, como o IVA da Europa – uma mesma regra básica para 27 países.
Antonio Palocci – Converso muito com investidores estrangeiros que, ao verem a política tributária, diminuem a vontade de investir. Já vi gente indo embora. Nosso trabalho na Comissão da Câmara foi exatamente tentar limpar um pouco. Querem fazer o IVA com 27 estados. Imposto sobre consumo tem de ser no lugar de consumo. Produção paga IPI (que deveria acabar havendo PIS e Cofins). Queremos fazer como a Europa, ter uma lei única, cobrar no destino a mesma alíquota para o mesmo produto. Hoje pagamos 12% em um lugar e 31% em outro – uma diferença brutal. É um passeio de notas. Nosso objetivo é corrigir isso. No tocante à abertura de empresas, legislação proposta em 2005 e aprovada no ano passado estabelece zero de imposto para se abrir uma microempresa e com um sistema simplificado de formalização (por meio eletrônico). Queremos ampliar esse modelo para o Pais, mas isso só será possível se conseguirmos criar um sistema tributário simples, que faça com que o Fisco veja todos de uma forma igual (hoje, temos 10 mil empresas respondendo por 50% do PIB). O papel da Receita não é fazer política tributária, é arrecadar. Esse é o um aspecto que temos de resolver com a sociedade: pagar de forma fácil para que todos paguem e paguem menos.
Romeu Chap Chap, conselheiro do Secovi-SP – recebemos recentemente o senador Delcídio Amaral, que falou sobre seu projeto de lei de anistia fiscal. Qual é o seu ponto de vista sobre essa matéria?
Antonio Palocci – Pessoalmente, acho que pode dar certo, mas desde que feito uma só vez. Se for periódico, penalizará quem pagou. Nos últimos 30 anos, tivemos 15 planos exóticos. Dizer que quem tirou recursos cometeu um crime, foi um crime de autodefesa, (já tivemos seqüestro de poupança). Sou a favor do projeto de lei do senador Delcídio, mas, como já disse, limitado a uma única vez. Se não, vira um prêmio a quem não paga impostos. É uma oportunidade para formalizar a situação de quem buscou se proteger.
Paulo Safady Simão, presidente da CBIC – o CDES foi uma das grandes criações do governo Lula. O diálogo resultou na criação do PAC, que destinaria R$ 48 bilhões para habitação de interesse social. Mas isso ainda não aconteceu. Veio depois a idéia de melhorar favelas e palafitas – apresentamos projetos. Depois, apresentamos a proposta do Moradia Digna que acabou sendo aproveitado no pacote habitacional a ser lançado em abril, com R$ 27 bilhões em subsídios diretos para famílias de baixa renda, redução de custos (cartórios, seguros, etc.) e menor burocracia. Isso, agora, está na pauta do Congresso Nacional e há o compromisso do governo Lula de fazer acontecer. Temos todos de estar envolvidos na consolidação de instrumentos para acabar com nosso déficit habitacional, que é uma vergonha. Mas há uma questão: foi criado o banco de investimento da Caixa para comprar ações de empresas privadas do setor imobiliário. Somos contra, firmamos um acordo, mas quando o assunto voltou para a Câmara, o que se aprovou foi a redação anterior que havíamos combatido. Assim, contamos com a sensibilidade do deputado Palocci para alterar esse quadro, pois conferir à Caixa o privilégio de comprar ações de empresas trará enorme distorção para o setor.
Antonio Palocci – Concordo que é um privilégio e tudo o que puder fazer para contribuir podem contar com minha presença.
Silvia Carneiro
Assessora de Assuntos Institucionais/Secovi-SP
















