Reunião de 13/4/2009
“Regulamentação do Lobby”

Desde 1989, o senador Marco Maciel luta pela aprovação de projeto de lei de sua autoria, cuja finalidade é uma só: a regulamentação do lobby. Aprovado no Senado em 12 de dezembro 1990, o projeto de lei nº 203 foi despachado na mesma data para a Câmara dos Deputados, onde permanece até hoje, aguardando decisão.
Para o senador, regulamentar a matéria é providência que deve ser inserida no escopo da reforma política. “O lobby correto é aquele que atende às demandas nacionais e não a interesses pequenos”, destacou o senador.
Segundo Romeu Chap Chap, presidente do Conselho Consultivo e coordenador do NAT, é inexplicável a demora na regulamentação. “A aprovação do projeto é básica para que, a exemplo do que ocorre em outros países, como os EUA (onde a regulamentação existe desde 1946), o lobby deixe de ter um cunho pejorativo, aliado à defesa de interesses privados em detrimento dos interesses coletivos.”
João Crestana, presidente do Sindicato, adiciona que a estigmatização decorrente da falta de normas claras faz com que todas as práticas lobistas sejam colocadas sob suspeição. “Mesmo aquele que faz tudo dentro da legalidade, que cumprem todas as exigências para financiamento de campanhas, por exemplo, terminam percebidos como fora da lei. Em momento algum as pessoas percebem que a prática lobista, feita com transparência e ética, nada mais é do que exercício puro da democracia participativa.”
Abertura
Romeu Chap Chap, presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP e coordenador do NAT, destacou que, nos EUA, a prática lobista é lícita e regulamentada desde 1946 – a Federal Regulation of Lobbyng Act, que inclusive inspirou o projeto do senador Marco Maciel. Em nosso país, sem qualquer regulamentação, o lobby e totalmente estigmatizado. Tem um curo pejorativo, aliado a interesses privativos, em detrimento dos interesses coletivos. Em corajoso artigo publicado no jornal “Folha de S. Paulo”, o presidente da Fiesp (e membro do NAT), Paulo Skaf, evidencia que a participação de pessoas físicas e jurídicas no processo político, mais do que um direito, é um dever cívico. Legitimidade, transparência, eficiência, ética e verdade nas práticas lobistas. Estes são os resultados que esperamos obter com a aprovação desse projeto.
João Crestana, presidente do Secovi-SP, considerou que o NAT reúne pessoas interessadas em formar uma nação. “De maneira homeopática, estamos fazendo isso, quando discutimos a necessidade de aprovar o projeto de lei que regulamenta o lobby. Lutamos pelo programa Minha Casa, Minha Vida, para atender ao mercado de habitações, aos trabalhadores da construção civil. Tivemos a honra de participar do programa e esperamos continuar exercendo esse lobby. Esperamos que a regulamentação do PL 203 seja mais um tijolo na formação da nação brasileira.”
Marco Maciel – Palestra
Fortalecimento das instituições
Precisamos investir muito no fortalecimento das instituições, melhorar a representatividade. Conforme disse o filósofo político Norberto Bobbio, as pessoas passam, as instituições ficam. Homens têm virtudes e defeitos, mas as instituições devem permanecer. Em nosso país, as instituições estão de alguma forma em crise e a insatisfação é expressa pela sociedade. É grande a cobrança por melhorias nas instituições políticas.
Reforma política
A reforma política remonta a Constituição de 88. Avançamos pouco nesse território, com aprovação de algumas leis, mudanças no código eleitoral e revogação de anacronismo, como a emenda que obrigava a vinculação. Mas há muito a fazer.
Lobby
A regulamentação do lobby está relacionada à reforma política, pois são matérias afins. Meu projeto de lei está há 20 anos na Câmara (não tenho sido bem sucedido em fazer o lobby do PL do lobby). Está pronto para votação. O PL é de 1989.
República x Federação
Baseado na Constituição de 88, o Estado Democrático de Direito reforça as instituição republicanas e o sistema unicameral, contrapondo-se à Federação. Rui Barbosa, que antes foi um federalista, converteu-se em republicano após reconhecer que na monarquia seria impossível fazer a federação que ele, e também Joaquim Nabuco, desejavam. A federação está em crise em razão da enorme concentração de poderes na União, em detrimento dos estados e municípios. A Constituição de 88 considerou os municípios como entes federativos. Miguel Reale observou nela o federalismo trino (União, Estados e Municípios), mas na prática o poder cada vez mais concentrado.
Práticas lobistas
Por que o lobby deveria constar do pacote de medidas da reforma política? É preciso reconhecer que a prática do lobby se dá de várias formas. Aparece com os grupos de pressão e instituições como sindicatos e federações. É feito por pessoas físicas ou jurídicas para uma interlocução. Saliente-se que o PL não foi aprovado até hoje porque não há um consenso. Quando presidi a Câmara dos Deputados, propus primeiramente uma regulamentação em âmbito interno. Depois concluiríamos regulamentar por lei, seguindo exemplos como o dos EUA.
Exemplo norte-americano
No final do século XIX os EUA já tinham leis sobre lobby em diversos estados. Existem também leis federais (algumas recentes). Há 10 anos, o congresso norte-americano aprovou legislação para regulamentar o lobby feito por país estrangeiro. Isso também é uma forma de fiscalizar. A lei estabeleceu limites, como recebimento de presentes, etc. O relacionamento entre grupos de pressão e parlamento é facilmente identificado e é um processo normal. Cabe ao governo administrar pressões e separar o joio do trigo (o lobby correto, que considera interesses gerais, e o não correto, focado em interesses pessoais.
Formas de agir
O PL procura estabelecer as formas de ação dos lobistas. Exige registro profissional (pessoas físicas e jurídicas) e prestação de contas (com informações à Receita Federal sobre suas atividades). Não é um projeto draconiano. Seria uma primeira iniciativa. O artigo 37 da Constituição Federal – ao qual está sujeita a administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, Estados e Municípios, estabelece obediência aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Transparência
A palavra de ordem é transparência, para que a instituição não fique vulnerável a ações não republicanas. Daí a necessidade de incluir o lobby quando se fala em reforma política, pois vai melhorar as instituições. Ideal é aprovar o projeto ainda este ano, porque 2010 é ano eleitoral. Além disso, uma lei eleitoral tem de entrar em vigor um ano antes das eleições. Assim, a aprovação da reforma política e do PL do lobby deveria ocorrer até setembro próximo.
Eleições caras
Os EUA também fazem eleições a cada dois anos. É um processo caro, tanto que se cogitou mudar isso na constituição local. Porém, no Brasil a democracia é mais cara ainda, pois aqui os horários em rádio e TV são pagos (e é o cidadão que paga isso).
Insegurança
Não conseguiremos ter instituições que respondam às demandas da sociedade com a insegurança jurídica que vivemos. Isso se reflete também no Exterior, cujos investidores perguntam se a lei não vai mudar. Tal condição gera uma fragilidade institucional que precisamos corrigir. Vivemos um Estado de Direito, com urnas eletrônicas e o segundo maior colégio eleitoral do mundo. Mas precisamos ter a convicção de há muito a melhorar no campo institucional.
Questão de governabilidade
As instituições respondem à sociedade fornecendo boas condições de governabilidade. Bobbio fez uma análise na obra “Entre Duas Repúblicas”: a da Itália saindo do fascismo e voltando para a república em 1946, e o Brasil, saindo do Estado Novo e indo para a chamada Constituição Liberal. A analogia vale, pois fortalecer as instituições é melhorar a governabilidade, o que é a grande questão de hoje.
DEBATES
Paulo André Jorge Germanos, conselheiro do Secovi-SP – Discutimos a reforma tributária com Antonio Palocci e a anistia fiscal com Delcídio Amaral e nos deparamos com o dilema: como aprovar uma sem a outra? Hoje, repetimos a situação: como aprovar o PL do lobby sem a reforma política? Atualmente, temos uma frente ampla pela reforma política, integrada por deputados do PT e ONGs não conhecidas. Não estaríamos diante de um movimento para enfraquecer o legislativo? Palocci foi claro ao apontar a grande resistência à reforma tributária por parte de estados e municípios: menos imposto significaria menor poder político.
Marco Maciel – Não é fácil avançar no campo tributário. Existem controvérsias e diversos caminhos. Esta reforma guarda semelhança com a política: se não houver acordo não se consegue andar (e fica mais difícil conforme as eleições se aproximam). Já se fala em 2010. A campanha já está na rua, o que dificulta a promoção de mudanças. Temos de tentar avançar e, ao mesmo tempo, impedir leis que tragam retrocessos. Exemplo: a questão da fidelidade partidária. Conseguimos por um ano (ideal seriam quatro), mas há proposta no sentido de que 30 dias antes das eleições o candidato poderá mudar de partido. É a negação do que foi feito antes.
Na Itália, mudança de partido é rara. Significa que o candidato vai entrar na lista e não será reeleito de pronto. Mas se fizéssemos algo assim também seria um retrocesso. Fundamental para a sociedade é a existência de partidos fortes e estruturados para uma boa interlocução com o governo. Quanto mais fortes, mais estabilidade política e mais representatividade.
Aqui temos maioria, minoria e ‘unoria’ (temos partidos de um só). Após a Constituição, apareceram 60 partidos. Poucos são os que possuem uma doutrina clara e precisamos fortalecê-los. Nos países do primeiro mundo, os partidos são organizados e são essenciais. Também precisamos atrair mais jovens para uma maior militância, fortalecendo as instituições relativas ao processo eleitoral.
Acho que a reforma política agora terá pouca chance de aprovação, mas não custa pensar em insistir para final de 2010, início de 2011. Reitero que instituições fortes asseguram a governabilidade. Vale lembrar o que dizia Juscelino Kubitschek: “O otimista pode errar, mas o pessimista começa errando”.
Quando veio para cá fugindo do fascismo, Bobbio escreveu o livro “Brasil é o país do futuro” com recomendações mínimas que precisamos cumprir. O Brasil é observado pela comunidade internacional como potencialidade, grande integração étnica e parceiros na América Latina. Reale fala do índio negro branco, a migração cultural formou um cadinho étnico que é um patrimônio nosso. Temos de esperar que, no 3º milênio, seja o país que sonhamos.
João Crestana, presidente do Secovi-SP – Barack Obama fez campanha por meios modernos, como a internet. No PL 203, como são enquadradas as novidades tecnológicas – caso específico da internet, que é uma tribuna permanentemente aberta?
Marco Maciel – Presido uma comissão que cuida da reforma do regulamento interno do Senado e objetiva modernizar o funcionamento da Casa, contando basicamente com os meios eletrônicos, o que também concorre para maior agilidade no processo deliberativo. O Congresso não é só a casa da lei. Possui também a responsabilidade do ato de fiscalizar, pois o parlamento é a palavra da nação. Legislar, fiscalizar e ser um fórum de debates é a função do Congresso, que é dividido entre os que sabem e os que não sabem. Quem não se interessar na tecnologia da informação ficará defasado, até porque temos de pensar em educação, a qual confere soberania ao cidadão.
Denis Lerrer Rosenfield, professor de Filosofia e articulista – A discussão da reforma política já está contaminada pelas próximas eleições. Por que vincular o lobby a essa reforma? Não seria melhor desvincular o PL?
Marco Maciel – O lobby isoladamente tem menos percalços. Mas é preciso dar mais visibilidade a essa questão no Brasil, revelando que as crises que temos enfrentado advêm da falta de regras. Tenho dúvida em avançar na matéria este ano – reformas política e tributária -, pois a maior dificuldade é contraria os entes federativos (União, Estados e Municípios).
Décio Tenerello, Geo Construtora e ex-presidente da Abecip – Quando se fala em lobby tem-se a visão do Legislativo e do Executivo. Não se inclui o Judiciário?
Marco Maciel – O PL trata apenas a questão do Congresso – não inclui Executivo e Judiciário. No que se refere ao Judiciário, não há como caracterizar função de lobby, mas o Executivo oferece espaço, porque faz propostas de leis. Se a legislação fosse mais ampla, incluiria certamente outras instituições. Considero que, uma vez aprovado o PL para o Congresso, as normas federais valeriam para assembléias e câmaras municipais.
Carlos Campilongo Camargo, vice-presidente do Secovi-SP – Em jantar da ADVB com Jarbas Vasconcelos, um dos pontos abordados foi a dificuldade da reforma política, pois quem tem de fazê-la é o próprio político. O que a sociedade pode fazer? Há o movimento Voto Consciente que se está espalhando.
Marco Maciel – Não avançamos mais porque não há uma demanda da sociedade. Com pressão legítima, o legislativo se move. Jarbas Vasconcelos é autor de PL, que já passou na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), o qual proíbe coligação em eleições proporcionais, pois essa prática permite que partidos diferentes se reúnam para fazer uma chapa – e não fica claro para o eleitor quem ele vai eleger (os mais votados entre os coligados são eleitos). Outra face oculta é que não ocorre a formação de verdadeiros partidos políticos. O voto para uma pessoa e uma coisa, o partidário é outro – que ajuda a vertebrar um partido forte. Vários países (44 deles, pelo menos) estabelecem, além da cláusula de desempenho (ou de barreira), que é proibido fazer coligação.
Na Alemanha, em 1949, fizeram uma lei fundamental até a reunificação do país, com cláusula de desempenho, a qual passou a ser aplicada em 1989 (quando houve a reunificação). Giovanni Sartori, cientista político italiano, quando veio ao Brasil proferiu palestras em São Paulo e no Distrito Federal, reuniu-se com Fernando Henrique Cardoso, etc. Na ocasião, disse estar com a idéia de um prêmio ao partido com melhor desempenho. Exemplo: o partido na Câmara Federal que obtivesse 30% de votos teria mais 5% para reforçar sua representação, com densidades eleitoral e programática maiores. Partidos são importantes para a prática da democracia.
Casualmente, peguei uma chapa da União Européia (são 27 países). Não tem nomes de pessoas, só de partidos. O voto não pertence à pessoa.
Vamos recuar para o Brasil da frustrada revolução de 30, a era Getúlio Vargas de 1932. Meu pai dizia que o movimento estava se distorcendo. Joaquim Murtinho falava que precisávamos republicar a República. Getúlio chamou Assis Brasil para presidir uma comissão para fazer a reforma do código eleitoral, estabelecendo que o mandato pertence ao partido (vota-se numa legenda). Aliás, cabe salientar que o Brasil é um dos poucos países a contar com uma justiça eleitoral. Isso foi positivo no ano passado, quando o TSE retomou essa tese (sem partidos fortes não há democracia forte). Conforme Antoine de Saint-Exupéry, “o essencial é invisível aos olhos”. A reforma política é essencial.
Romeu Chap Chap, presidente do Conselho Consultivo do Secovi-SP – É frustrante saber que a reforma política não vai acontecer em 2009 nem em 2010. Como podemos ajudar a fazer acontecer? Só temos notícias ruins. Por isso constituímos esse grupo. Qual é o caminho? Lula dizia nas reuniões do CDES que precisamos pressionar o Congresso, mas nada tem adiantado. Mas precisamos de ensinamentos sobre como pressionar.
Marco Maciel – A angústia de Romeu Chap Chap é também a minha. A mobilização da sociedade nos ajudará muito.
Silvia Carneiro
Assessora de Assuntos Institucionais/Secovi-SP











