Reunião de 29/7/2013

O Brasil está pronto para os megaeventos esportivos?


No início deste ano, Aldo Rebelo, ministro do Esporte, publicou em alguns jornais do País artigo em que usou o velho Restelo, do épico Os Lusíadas, para traçar um paralelo com o pessimismo de muitos brasileiros em relação à realização da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Na obra de Camões, quando as naus de Vasco da Gama se preparavam para empreender uma das mais ousadas e bem-sucedidas viagens da época das grandes navegações, o ancião Restelo caminhava pela praia do Tejo meneando a cabeça, mostrando seu descontentamento e reprovação à viagem às Índias. “O velho Restelo saiu da literatura para entrar na vida real como sinônimo de conservadores ou pessimistas. Sua alma pequena agoura o esforço que o Brasil empreende para receber a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos”, escreveu o ministro. Foi para falar sobre o legado desses dois megaeventos ao País que a reunião da Política Olho no Olho, em parceria com os membros do NAT (Núcleo de Altos Temas), recebeu o titular da pasta dos Esportes.

“Não podemos assumir o pessimismo. Antes de tudo, é preciso saber valorizar o legado dessas iniciativas, que vai muito além das obras. Em verdade, é forte instrumento para fazer renascer o espírito cívico e a união indispensáveis para que possamos enfrentar e superar as adversidades”, disse Claudio Bernardes, presidente do Secovi-SP, na acolhida a Aldo Rebelo. Ainda segundo o dirigente do Sindicato, ambos os eventos são oportunidades para que o Brasil se valorize perante o mundo. Romeu Chap Chap, coordenador do NAT, pontuou os feitos de Aldo Rebelo durante seus 30 anos de atividade política: presidente da Câmara dos Deputados e da CPI da Nike, líder da equipe de Coordenação Política do governo Lula, relator da Lei de Biossegurança – cujo texto final derrubou a proibição de pesquisas com células-tronco – e relator do Novo Código Florestal. “Em outubro do ano passado, Aldo Rebelo assumiu o comando do Ministério do Esporte e a desafiadora missão de preparar o País para os dois mais importantes eventos esportivos do planeta”, disse Romeu.

Copa do Mundo e Olimpíadas: plataformas de desenvolvimento para o Brasil

Aldo Rebelo iniciou sua apresentação assegurando que o Brasil “tem todas as condições” de receber a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Ambos os eventos – os dois maiores do planeta, na concepção do ministro – devem colocar o País no centro das atenções, em âmbito mundial. “A Copa é tão disputada que a China já se apronta para [tentar sediar] a de 2040. A Argentina, que quer disputar a de 2030, também já se mobiliza”, afirmou, tornando patente a relevância com que os candidatos a receber esses eventos arrostam o desafio. Ainda conferindo o significado especial da Copa, Rebelo afirmou que três bilhões de pessoas em todo o planeta devem assistir à disputa. “A final e a semifinal da Copa das Confederações do Brasil foram os dois eventos mais vistos no mundo”, denotou.
Rebelo avalia que os dois megaeventos são “plataformas de desenvolvimento” para o País. Ancorou-se, para isso, em pesquisas realizadas pela Ernst Young e pela Fundação Getúlio Vergas. Serão 3,63 milhões de empregos gerados e R$ 142,39 bilhões adicionados à economia até 2014. Desse montante, R$ 22,46 bilhões serão destinados à infraestrutura e à organização. Ainda de acordo com o levantamento, o impacto direto sobre o PIB compreendido entre os anos 2010 e 2014 será de R$ 64,5 bilhões. Construção civil, A&B (alimentos e bebidas) e empresas de prestação de serviços (públicos e privados) são os setores que mais se beneficiarão nesse cenário. “Para cada real de investimento público, serão 3,4 reais de investimento privado”, afirmou. Citou como exemplo uma linha de crédito de R$ 1 bilhão montada pelo BNDES para obras de infraestrutura – praticamente esgotada –, e o investimento da ordem de R$ 1,5 bilhão que uma rede hoteleira francesa faz no Brasil.
As três grandes arenas que a cidade de São Paulo deve ganhar nos próximos anos – a do Corinthians, a do São Paulo e a do Palmeiras – foram apontadas por Aldo Rebelo como bons legados, embora duas delas estejam fora roteiro dos jogos oficiais e cujas expensas não estão no rol dos investimentos previstos pelo governo para a Copa. Rebelo lembrou que essas arenas serão mais do que meros estádios: serão grandes centros de eventos. Citou o Morumbi, que pretende construir um hotel em um terreno recém-adquirido pelo clube e cobrir o gramado. “Eles arrecadam R$ 50 milhões por ano com as vendas e aluguel de espaços para academias, bancos, lojas”, disse Rebelo. Segundo ele, esse modelo de gestão de arenas será seguido em todo o País. Atendo-se à realidade paulistana, lembrou que esses empreendimentos serão benéficos para a cidade, pois o único grande espaço para evento em São Paulo, hoje, é o Anhembi. Lembrou que não foi possível trazer o centro de mídia da Copa das Confederações para cá em virtude da falta de espaço.

O ministro procurou refutar a pecha de “elefante branco” de vários estádios. Reconheceu que as arenas de Cuiabá, Brasília e Manaus devem receber poucos jogos dos campeonatos nacionais e locais. Socorreu-se no exemplo do estádio de Wembley, em Londres, o qual recebe, em média, dez jogos por ano. A maior parte de sua rentabilidade, no entanto, advém de eventos, casamentos, museus, restaurantes, bares e visitação – ou seja, pela exploração comercial do espaço. Os estádios brasileiros também farão dinheiro por métodos similares. Rebelo pontuou que a empresa que constrói a arena de Natal já iniciou a comercialização espaços internos pelos melhores preços da cidade.

Sobre o andamento das obras, o ministro admitiu que manter o cumprimento dos prazos é uma tarefa hercúlea. “Se eu disser que está tudo 100%, não é verdade […] Temos de correr bastante”, reconheceu, sem abrir mão de encetar a contribuição “civilizatória” do futebol ao País. O esporte, para ele, “promoveu a discussão sobre a diferença no Brasil”. Disse que os maiores clubes de futebol têm torcidas nacionais. O Corinthians, de São Paulo; e o Flamengo, do Rio de Janeiro, são os expoentes dessa dinâmica, com torcidas mobilizadas em regiões afora do Sudeste – a maior torcida do Paraná é corintiana, com o dobro de torcedores do segundo colocado, o Atlético Paranaense; e em muitos estados do Norte e do Nordeste, o Flamengo é o time do coração da maioria. “Isso tem um papel importante na coesão nacional […] No Amazonas, crianças de comunidades ribeirinhas se identificam por meio de uma camisa de futebol”, ilustrou.
Do modo como o povo brasileiro recebe estrangeiros à influência espiritual exercida pela Bahia e como ela impacta quem visita o estado, Rebelo interpretou nossa cultura como o baluarte sobre o qual nossa identidade nacional foi concebida. Rememorou a conversa que teve com dois turistas de fora do País. Um deles, jornalista correspondente internacional e adepto do islamismo, foi elogíaco quanto à nossa diversidade de culto e tolerância religiosa. Na Europa, ele se sente tolerado; no Brasil, acolhido. Nesse sentido, a Fifa quer aproveitar o mundial do ano que vem e usar o Brasil como plataforma para promoção de uma campanha mundial contra a discriminação racial.

Copa das Confederações: passamos no teste – “Mesmo com manifestações por todo o País, nenhuma seleção foi afetada na questão de tempo para chegar ao estádio”, disse Rebelo, ao justificar o porquê de o Brasil ter sido aprovado no desafio de receber a Copa das Confederações. Rebelo também disse que nenhuma emissora de TV – e havia muitas, de vários países – reclamou da qualidade da transmissão das partidas. Vale considerar que, em comparação com o número de emissoras credenciadas para a Copa da África, a Copa das Confederações recebeu o dobro de credenciamentos. O sinal de telefonia – “um problema no planeta todo”, na avaliação do ministro – permaneceu estável, mesmo dentro dos estádios lotados. “Em Londres, três da tarde, na região central durante as Olimpíadas, eu não conseguia falar”, comparou. A Fifa reconheceu que as arenas foram realizadas com modernas tecnologias, tanto no processo construtivo quanto no acabamento, e sempre respeitando o quesito sustentabilidade. Os estádios, inclusive, contam com selos de certificação.

Bom dentro de campo, já fora dele… – No ranking mundial da Fifa das melhores seleções de futebol, o Brasil ocupa a nona posição. O talento de nossos jogadores sempre se sobressai aos olhos do mundo – haja vista a quantidade de atletas brasileiros atuando em clubes europeus. Talento para o futebol o País tem. Dentro de campo somos bons, já fora dele, a realidade é diferente. “Não conseguimos gerar emprego e renda com o futebol. Mesmo quem vai a estádio com dinheiro não tem onde gastar”, disse o ministro. Recorreu à frieza cáustica dos números: “Temos apenas 2% do PIB do futebol mundial”, lamentou. A discrepância torna-se evidente quando se compara nosso desempenho ao dos ingleses, que têm 30%. Os alemães possuem 20%; os espanhóis, 18%; os italianos, 16%. O Corinthians só agora vê seu estádio próprio sendo construído. O Flamengo, arregimentador de uma das maiores torcidas brasileiras, não tem arena. Enquanto isso, times de segunda ou terceira categoria na Espanha, Alemanha e Itália têm suas próprias casas.

Cada obra deve ser celebrada – “Temos hoje uma legislação em que cada coisa que acontece na gestão pública é quase um milagre. Você tem que celebrar como um milagre, porque tudo é feito para não acontecer”, murmurou Rebelo, ao chamar a atenção à forte atuação dos órgãos de controle do governo (como o Tribunal de Contas da União – TCU), ao lobby ambiental e aos diversos impeditivos por eles impostos a grandes obras. “A contrapartida disso muitas vezes é a paralisia: levamos mais tempo para construir a segunda ou terceira pista do aeroporto de Brasília do que levamos para construir Brasília. No meio da obra, um lobo-guará cruzou a pista, e só pra fazer o estudo do lobo-guará levou um tempão. Preservar é importante, mas sempre com racionalidade”.

Manifestações: fator positivo – Para Rebelo, as manifestações havidas por todo o País devem ser vistas como positivas. “Creio que as razões fundamentais [para os protestos] são nossas deficiências em serviços como educação, saúde, transporte e segurança pública. As pessoas viram que a competição estava acontecendo em estádios modernos, que foram entregues dentro do prazo, e acharam que, se nós podíamos fazer a Copa das Confederações com tanta eficiência, por que não poderíamos ter eficiência também em saúde e educação, transporte e segurança pública? É isso o que elas querem”, disse. Ainda segundo o ministro, as manifestações foram mais elogio do que admoestação ao governo. “Isso não tem tanto sentido crítico, mas sim de reconhecer nossa capacidade em algumas coisas, que deveria ser transferida para outras”, finalizou.

Leandro Vieira
Assessoria de Comunicação/Secovi-SP

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